Burning Man



Quem nunca ouviu falar no Burning Man tem que ler a reportagem que coloco a seguir e ver os vídeos. Fiquei fascinada com a proposta do encontro de diversidade, bizarrices, fantasias, liberdade, arte, cultura, imaginação, delírio, loucura, comunicação e tudo o que mais existe nesse planeta. Deve ser uma experiência libertadora e inesquecível. Eu só teria que arrumar um jeito de comer bem, pra não tomar o rumo de um hospital 2 dias depois.

O quê: Evento indefinível (veja box anexo). Acontece anualmente, desde 1986, e dura uma semana, culminando na queima do "homem", uma estátua de madeira de 15 metros de altura.

Onde: Deserto de Black Rock, Nevada, Estados Unidos.

Quando: Entre fins de agosto e começo de setembro.

Porquê: As histórias divergem quanto ao motivo da queima do homem. Seu idealizador e coordenador se chama Larry Harvey.

Quanto: O ingresso varia de 65 a 140 dólares, dependendo da antecedência com que é adquirido.

Como: É preciso levar todos os itens necessários para sua sobrevivência pessoal no meio do deserto. O cupom de entrada diz em letras bem grandes: "Você está assumindo voluntariamente o risco de morte ou danos graves ao comparecer a este evento." Ao partir, é preciso levar absolutamente tudo embora, deixando o local no mesmo estado em que foi encontrado.

Quem: Mais de 20 mil pessoas participaram do Burning Man este ano. http://www.burningman.com/



Nossa correspondente especial, Lenara Verle, conta como foi sua primeira e inesquecível experiência no Burning Man:

De Portland, Oregon, até Black Rock City, Nevada, são nove horas de viagem, ou doze se você estiver dirigindo uma kombi de acampar ano 69. Adicione a isso mais umas doze horas se a kombi quebrar no meio do caminho, como foi o nosso caso. Mas cada uma das horas vale totalmente a pena. Durante o passeio a paisagem vai se transformando de uma floresta de coníferas a uma savana com arbustos aqui e acolá. Passamos por cidades cada vez menores e estradas cada vez mais estreitas, culminando em estrada nenhuma. Black Rock City é na verdade um pedaço de deserto no meio do nada, sem água, eletricidade, e quase nenhuma forma de vida durante 358 dias do ano. O chão não deixa nada a dever ao triângulo das secas, e é carinhosamente chamado de "playa" pelos participantes do evento. Sobre ele é erguida a estrutura de uma verdadeira cidade, com a quinta maior população do estado de Nevada durante os 7 dias de duração do Burning Man - um gigantesco acampamento em forma de lua crescente, com ruas e praças, e a imensa estátua de madeira e neon do "homem" ocupando o espaço central. Após passar o portão de entrada e receber meu "guia de sobrevivência no deserto", segui para o endereço onde meus amigos estariam acampados – 2:15, logo depois de Júpiter. Antes de perguntar "que raio de endereço é esse?", é preciso levar em conta que um dos objetivos do Burning Man é o de quebrar convenções: assim, as ruas radiais a partir do centro são numeradas como horas em um relógio, e os círculos que se espalham levam o nome dos planetas do sistema solar. Logo após a desorientação espacial inicial pensei: como faço agora para marcar o tempo, se as horas já estão sendo usadas para fins de localização? A resposta, óbvia após o primeiro dia é: quem precisa de relógio afinal de contas? Subitamente, um mundo novo se descortina, e coisas imprescindíveis como dinheiro, carro, roupas e banho diário tornam-se totalmente supérfluas. Em compensação, damos mais valor às coisas realmente importantes como água, protetor solar, bastões fluorescentes e um bom papo com pessoas que nunca vimos antes.

O ponto central do festival é a diversidade. É praticamente impossível encontrar uma definição para o evento. Um participante orgulhoso pode chamá-lo de "comunidade experimental temporária", e um repórter deslumbrado de "campo de nudismo misturado com circo de aberrações povoado por malucos e ravers". Cada um tem uma visão diferente, e você pode inventar a sua própria, usando o box abaixo ou a imaginação.
No Burning Man encontram-se mais coisas exóticas e diferentes por centímetro quadrado do que o cérebro humano pode absorver. O resultado é uma overdose dos sentidos, agravada pelas poucas horas de sono que fatalmente se seguem. Como dormir com tantas coisas acontecendo ao mesmo tempo? Cada um dos milhares de acampamentos temáticos merece uma visita de pelo menos um dia. Em um lugar você pode escrever seu pedido ao deus do fogo, em outro fotografar a sua vagina para a posteridade, ou controlar luzes piscantes em um arco na areia, passear de camelo, mandar mensagens para o espaço, dançar até amanhecer, andar de avião pelado, ser psicanalisado, entrar em um concurso de fantasias, dar e/ou receber massagens, tomar sorvete, levar choques elétricos, participar das mais variadas seitas, práticas alternativas, aulas, rituais e festas. Tudo isso sem nenhum tipo de transação monetária. A doação e o escambo imperam na playa, um oásis no meio do país mais consumista do planeta.Após o deslumbramento e ansiedade, vem a vontade de ser um verdadeiro "participante" do evento, e não um mero espectador. De sair em busca de novos amigos e de um lugar aconchegante no meio do sol escaldante e das tempestades de areia ocasionais. Convenientemente, bem no finzinho do lado "quieto" da cidade (menos barulhento seria uma descrição mais apropriada) se esconde a Bianca’s Smut Shack. Uma grande tenda coberta por lençóis coloridos, com dezenas de sofás macios e almofadas, uma pista de dança com DJs se revezando durante as 24 horas do dia e garçons voluntários oferecendo sanduíches de queijo grelhado recém-feitos acompanhados da frase "Bianca te ama".Bianca’s é o que pode se chamar de "lar" no meio do deserto. Seus organizadores, auto-intitulados "trolls", levantam fundos o ano inteiro para poder doar comida, bebida, divertimento e abrigo aos participantes do Burning Man durante uma intensa semana. O clima de doação é tão contagiante que quando vi estava pilotando o fogão no turno da madrugada até o sol nascer, e servindo drinques para os freqüentadores da maneira mais original possível: esguichando suas goelas com uma imensa pistola de água. Ninguém parecia se abalar, e porquê deveriam? A maioria deles vestia máscaras esdrúxulas, ou apenas uma camada de tinta brilhante e nada mais. No Burning Man, o surreal é a norma, não a exceção. Difícil mesmo é se readaptar ao mundo "normal" depois que tudo acaba. Muitos relatam terem suas vidas mudadas por "insights" súbitos no meio da playa deserta. Outros verificam uma felicidade generalizada por meses. Quase todos voltam nos anos seguintes, com mais idéias mirabolantes para acampamentos temáticos e instalações artísticas. Para eles, o Burning Man é sempre uma experiência nova e inesquecível.

O dia-a-dia no deserto
No Burning Man tambem há espaço para aquelas coisas tão triviais do nosso cotidiano:

Para um delicioso almoço, por exemplo, basta tirar da mochila um pacote de "Tasty Bites" - porções de comida tailandesa convenientemente acondicionadas em saquinhos metalizados, que podem ser preparados apenas deixando-os cozinhar por 15 minutos no chão do deserto.

Um café expresso pode ser barganhado em troca de um strip-tease, e você pode acender o cigarro no lança-chamas portátil do vizinho.

Para ir rapidamente de um lugar a outro da cidade, dá pra escolher entre sofás motorizados, riquixás com ou sem abanador acoplado, um bar sobre rodas, ou o gorila que carrega as pessoas nas costas. Até as dez da manhã meninas de topless ganham carona de avião sem pagar nada. Andar de camelo é mais difícil - o camelo tem que ir com a sua cara, ou então nada feito.

Se você sentir falta de algum outro item indispensável do seu cotidiano e não encontrá-lo no Burnign Man, crie seu próprio acampamento temático no ano seguinte e faça felizes outras pessoas com você.


Este site também é muito legal:
http://www.digestivocultural.com/colunistas/coluna.asp?codigo=119

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